COP30 no Brasil pelos olhos de um ecoativista

COP30 no Brasil pelos olhos de um ecoativista

Eu acompanho as cúpulas do clima há muitos anos e, para ser sincero, raramente crio ilusões. Mas a COP30 em Belém — não é um encontro qualquer. Dez anos após o Acordo de Paris — é como a revisão do planeta: ou confirmamos que ainda seguimos rodando, ou admitimos que o motor fuma e a direção tem folga.

O que está acontecendo em Belém agora

A conferência ocorre de 10 a 21 de novembro, em Belém do Pará, na foz do Amazonas. Me parece que a simbologia é óbvia: discutir o futuro do clima nos «pulmões do planeta» — é a ótica correta. Mas já nos primeiros dias aconteceu o que geralmente fica nos bastidores: protestos de povos originários, tentativa de invasão do local, confrontos com a segurança, feridos. Em outras palavras, o conflito não está «na teoria», e sim logo na entrada da sala de negociações.

Vejo nisso um sinal importante: sem terra, direitos e segurança para quem de fato sustenta a floresta, nenhuma «contabilidade de carbono» vai salvar a situação.

Por que isso importa dez anos depois de Paris

Paris definiu a meta de manter o aquecimento perto de 1,5 °C. Hoje, cientistas e a ONU reconhecem: provavelmente vamos ultrapassar esse limite temporariamente. É como tentar reter água na pia com a vedação gasta — o fluxo diminuiu, mas o vazamento não parou. Portanto, são necessárias ao mesmo tempo três alavancas: cortar emissões, ampliar a adaptação e financiar a transição.

Quem veio e quem não veio

No início marcaram presença Lula, Macron, Keir Starmer, Ursula von der Leyen, o Secretário-Geral da ONU. Mas vários líderes faltaram ao cume. Os EUA desta vez não participam no nível da administração, e a China também não está representada por sua principal liderança. Para mim, este é o principal ponto negativo da semana: quando o segundo maior emissor e grandes produtores de petróleo ficam de fora, o ritmo da solução global cai.

Dinheiro, petróleo e a «roteiro» Baku-to-Belém

O Brasil, junto com o Azerbaijão, promove a ideia de mobilizar até 1,3 trilhão de dólares por ano até 2035 para financiar a transição em países em desenvolvimento. Parece grandioso. Mas vejo duas bifurcações.

  • Força jurídica: por enquanto é mais uma declaração de intenções do que um acordo vinculante.
  • Consistência do Brasil: continuar concedendo licenças de petróleo e gás corrói a confiança. É como prometer entrar em dieta parado diante da vitrine de éclairs.

A UE, por sua vez, impulsiona o mundo a planos atualizados de redução de emissões até 2035 e ao apoio a mercados de carbono. Na UE já há uma trajetória acordada para menos 90% até 2040 e neutralidade climática até 2050; há também marcos intermediários para 2035. Minha experiência diz: quando grandes economias não apenas prometem, mas apresentam regulamentos operacionais e dinheiro, isso puxa a cadeia de fornecedores no mundo inteiro.

Amazônia e os direitos dos povos originários

O que mais me pegou foi que o protesto não era sobre slogans abstratos, e sim algo muito concreto: parar o desmatamento, as minas ilegais, a pressão do agronegócio. Imagine que você é o guarda da sua aldeia, mas as chaves do portão estão com alguém na capital. Em outras palavras, sem a consolidação jurídica dos direitos sobre a terra e os mecanismos de proteção, falar de «paraísos de carbono» na Amazônia — é vazio.

Lula apresentou o fundo «Florestas Tropicais — para sempre». A ideia é correta: recompensar pela conservação de ecossistemas. Mas, para mim, o teste chave — é se o dinheiro vai chegar às comunidades e se os contratos vão considerar práticas tradicionais, sem impor moldes industriais.

O que realmente está em discussão

  • Abandono dos combustíveis fósseis: depois das palavras na COP28 o mundo ainda precisa de um plano com datas, setores e apoio ao emprego.
  • Financiamento: como chegar a ≥1,3 trilhão por ano até 2035 e não afundar na dupla contagem e no «omegalatinês» verde.
  • Energias renováveis e eficiência: dobrar a eficiência e triplicar as renováveis até 2030 — fica bonito no banner, mas exige redes, armazenamento e produção local.
  • Metano: ganhos rápidos ao cortar vazamentos na exploração de petróleo e gás, em aterros e na agropecuária.
  • Adaptação e perdas e danos: indicadores de prontidão, alerta precoce, seguros e financiamento da reconstrução.
  • Florestas e biodiversidade: transição de projetos para programas jurisdicionais, onde monitoramento, direitos e pagamentos se encontram no mesmo sistema.

Onde pode haver avanço e onde nos espera uma pausa pegajosa

Avanço rápido Vagaroso e político
Metano, padrões de reporte, indicadores de adaptação, ampliação dos planos nacionais até 2035. É a zona em que as soluções técnicas já estão na mesa. Formulação do «abandono de petróleo e gás» com datas, preço global do carbono, distribuição das obrigações financeiras. Aqui os interesses de exportadores e importadores divergem

Como eu interpreto os protestos em Belém

Para mim, é uma lição de simplicidade: se na entrada do cume as comunidades originárias são forçadas a romper barreiras, é porque seu canal de participação não funciona. É como numa cidade em que a ciclovia foi pintada, mas o meio-fio não foi rebaixado: formalmente está lá, na prática — não.

O que fazer já amanhã

  1. Para governos: assegurar em lei os direitos dos povos originários sobre a terra e as florestas na jurisdição nacional; integrá-los à tomada de decisão; abrir acesso direto ao financiamento das comunidades.
  2. Para empresas: publicar planos de redução dos Escopos 1–3 com marcos intermediários para 2030 e 2035; eliminar a contabilidade «criativa» de compensações (offsets); cortar metano e vazamentos como «frutos fáceis».
  3. Para cidades e regiões: planos locais de adaptação com mapa de vulnerabilidades, abrigos térmicos, gestão da água e proteção contra inundações.
  4. Para doadores e bancos: instrumentos simples e previsíveis: pagamentos por resultados em florestas, crédito barato para redes e renováveis, subsídios para alerta precoce.

A rota europeia e seu efeito

A UE impulsiona metas atualizadas até 2035 e, na prática, constrói uma ponte para menos 90% até 2040 e neutralidade até 2050. Gosto disso por uma razão simples de matemática: quando uma região com mercado forte estabelece padrões, fornecedores no mundo todo precisam se ajustar. Não se trata de «moral», e sim de competitividade e acesso a mercado.

Como saber se a COP30 deu certo

  • Surgiu um texto sobre abandono gradual dos combustíveis fósseis com marcos temporais e proteção do emprego.
  • Há um plano mensurável para 1,3 trilhão por ano: fontes, mecanismos, verificação de dupla contagem.
  • Metano: compromissos concretos dos setores e países-âncora para controle de vazamentos.
  • Florestas: arquitetura operacional do fundo com financiamento direto às comunidades e garantias jurídicas de direitos.

Se esses pontos não existirem

Então, pela minha experiência, teremos de novo discursos fortes e inércia fraca. Isso significa mais calor extremo, enchentes e migrações, como agências humanitárias já alertam.

O que vou acompanhar até o comunicado final

  • Formulações finais sobre petróleo, gás e carvão.
  • A arquitetura final do financiamento climático e o papel do capital privado.
  • Detalhes da iniciativa «Florestas Tropicais — para sempre» e a proteção dos direitos dos povos originários.
  • Planos atualizados dos países até 2035 e a sua comparabilidade.

Concluindo. Acho que a COP30 — é um teste de maturidade. Já não bastam metas bonitas; precisamos de tabelas tediosas, responsabilidades distribuídas e dinheiro que chegue a quem sustenta a floresta e constrói redes. Se Belém trouxer isso, os dez anos desde Paris não terão sido em vão.